José Feldman (Chuva de Versos n. 317)
Uma Trova de Ponta Grossa/PR
José Corrêa Francisco
O tempo, veloz, avança,
consumindo nossos anos.
Vamos perdendo esperança
e colhendo desenganos…
Uma Trova de Santos/SP
Carolina Ramos
Pequenino grão latente,
que brota e aos poucos se expande,
criança é humana semente,
na conquista de ser grande.
Um Poema de Curitiba/PR
Vanda Fagundes Queiroz
Menino da feira
Menino da feira,
esperto e magrinho,
tão cedo na vida
perdeu seu lazer.
Carreto, moça?
Baratinho, dona!
Posso cuidar do carro, tia?
Menino insistente
pedindo com os olhos
que guardam no fundo
segredos do lar…
(Talvez o pai fugiu…
A mãe leva para fora…
Oito irmãozinhos com fome...)
Menino
sem direitos…
só deveres.
Seus pais, onde estarão?
Talvez você seja filho…
da minha própria omissão.
(1º lugar no Concurso Rosacruz, em Guarulhos, SP)
Uma Trova Humorística de Belo Horizonte/MG
Almira Guaracy Rebelo
Sempre a rebaixar a idade...
Mania da tia Stela,
que chegou à raridade
de voltar a ser donzela!
Uma Trova de São José dos Campos/SP
Myrthes Masiero
Eu vivo na corda bamba
tentando me equilibrar,
mas sem ter você, caramba:
nem consigo me encontrar.
Um Soneto de Curitiba/PR
Vanda Fagundes Queiroz
Conversa Calada
Com tanto sentimento solitário,
meu existir interno é tão intenso,
que para reparti-lo às vezes penso
num interlocutor imaginário.
E sinto, então, falar de modo vário
minha alma com seu repertório imenso,
tão vasto que nem sei como é que venço,
sozinha, o turbilhão do meu fadário.
Embora eu tenha apenas uma vida,
termino por fazer-me bipartida,
se eu mesma falo e escuto a minha voz.
Na minha eterna e ardente introversão,
de tanto argumentar com a solidão,
eu vivo sempre dialogando... a sós.
Um Soneto de Curitiba/PR
Vanda Fagundes Queiroz
O som de minha voz inutilmente
acontece, sem cor e sem motivo.
Tão diverso é o real mundo que vivo
da hora em que pareço estar presente.
É presença enganosa, que desmente
outra força suprema — a do furtivo
viver por dentro, onde, devota, arquivo
ignotos pulsares da alma ardente.
A voz que fala, o riso, a cor que é vista
é invólucro somente, e bem despista
do meu ego a essência, a vida inteira...
E, assim, esta duidade faz-me artista
na arte de viver de forma mista:
a que parece ser.,. e a verdadeira.
Trovadores que deixaram Saudades
Cesídio Ambroggi
Natividade da Serra/SP (1893 — 1974) Taubaté/SP
Há nos velhos corações
uma fonte - a da saudade,
que reaviva emoções
vividas na mocidade.
Um Soneto de Curitiba/PR
Vanda Fagundes Queiroz
A cor da minha trísteza
A tristeza em meus suspiros tão frequente,
não lhe vês o ar de órfã desolada,
não entendes sua voz — brado silente,
não lhe dás nunca razão, nem cor, nem nada..,
E ela tem, nítida, a cor do riso ausente...
É triste andante de faces desbotadas,
tem a cor dos pés descalços, do inclemente
abrigo sujo ostentado nas calçadas.
Tem a cor do pranto, alheio, sofre o espinho
que a tantas flores impede de brotar.
Tem a cor da nulidade de um caminho
que — acaso existe? — ninguém logra alcançar:
a cor de um mundo de risos tão mesquinho,
tão farto em dor, que dá cor ao meu penar...
Uma Trova de São Paulo/SP
Analice Feitoza de Lima
Por ser da lista, o primeiro,
jamais entendi por que,
conquistei o mundo inteiro,
mas não conquistei você...
Um Haicai de Bandeirantes/PR
Neide Rocha Portugal
Mexilhões nas rochas –
também nessas minhas mãos
calos encravados
Um Soneto de Curitiba/PR
Vanda Fagundes Queiroz
Tento louvar a beleza do universo,
cantar o céu, o infinito, o sol, a flor.
No silêncio existe som que escuto em verso,
do matiz inexistente vejo a cor.
Numa gota d’água posso ver, submerso,
do gigante mar azul todo o esplendor.
Penso ern rosas onde o espinho mais perverso
cresce, banindo a alegria e impondo a dor.
A solidão povoei, o peito imerso
nos meus sonhos enfeitados com o verdor
da esperança, alado aroma ao céu disperso.
A viver concebo o Bem. Em meu fervor,
sonhando a Paz, quando há guerra, quão diverso
vê-se o mundo no altar-mor do meu Amor!...
Uma Trova de Curitiba/PR
Nei Garcez
Previdente, com confiança,
e equilíbrio tão fiel,
cuida, o anjo, da criança,
que balança no cordel!
Um Soneto de Curitiba/PR
Vanda Fagundes Queiroz
Cota suficiente
Bendita a pérola pequena e inculta
que fartas vezes vislumbrar logrei
na concha humilde, a única que herdei
do mar imenso que agiganta e avulta.
Bendito o mínimo botão que a estulta
gente distante, nos jardins que andei,
calcou aos pés. Pois dele me apossei,
deixando a todos, livre, a rosa culta.
E vendo o mundo em ouro se encantar,
busquei nas coisas simples me abrigar,
sem ter cobiça a ventura imponente.
Fortuna tenho, imensa, a ostentar:
pois no alto vendo o astro-rei brilhar,
eu desejei a sombra. Simplesmente..,
Uma Trova do Rio de Janeiro/RJ
Lúcia Lobo Fadigas
Ouço harmonias nas águas;
ouço acordes no tufão;
mas na avalanche das mágoas
nem ouço o meu coração!...
Um Soneto de Curitiba/PR
Vanda Fagundes Queiroz
A meu filho
Vejo a criança de ontem em você
que embalei nos meus braços ternamente,
Sinto inundar-me de emoção porque
eu vi botão a flor hoje imponente.
Ao pressentir o homem que, latente,
eu já descubro e quase já se vê,
tenho almejado que haja tão somente
o bem, no mundo que se lhe antevê.
Não saber-lhe o porvir faz-se tortura
que na alma-mãe me paira e assim perdura
na ânsia vã de pautar-lhe a jornada.
Uma lágrima oculta, na costura
enxugo. E rogo a Deus que faça pura
e perfumosa a flor por mim plantada.
Uma Quadra de Vila Real de Santo António/Portugal
Antonio Aleixo
(António Fernandes Aleixo)
1899 — 1949, Loulé/França
Da guerra os grandes culpados,
que espalham a dor na terra,
são os menos acusados
como culpados da guerra.
Um Haicai de Curitiba/PR
Alvaro Posselt
Regresso do mar –
Vem arcado o pescador
com os mexilhões
Uma Trova de Caicó/RN
Prof. Garcia
A liberdade do poeta,
está num verso... Num grito...
No equilíbrio se completa,
vencendo o próprio infinito!
Um Soneto de Curitiba/PR
Vanda Fagundes Queiroz
Antes de fechar a porta
Recordo, muita vez, sentada à porta
de mim mesma, o tão nosso antigamente!
O que espreito, bem sei, não mais importa
que a mim só que de novo estou presente.
É a mão da saudade que transporta
o que sou ao que fomos. De repente,
tanta coisa, com rótulo de morta,
vive em mim nova vida, inteiramente...
Julgas mera tolice a devoção
de minha ardente peregrinação
ao passado. E me acordas à verdade.
Volvo ao deserto de viver, então.
Mas, antes de esconder o coração,
guardo já dentro mais uma saudade.
Recordando Velhas Canções
Fim de caso
(samba-canção, 1959)
Dolores Duran
Eu desconfio que o nosso caso está na hora de acabar
Há um adeus em cada gesto, em cada olhar
Mas nós não temos é coragem de falar
Nós já tivemos a nossa fase de carinho apaixonado
De fazer versos, de viver sempre abraçados
Naquela base do só vou se você for
Mas de repente, fomos ficando cada dia mais sozinhos
Embora juntos cada qual tem seu caminho
E já não temos nem coragem de brigar
Tenho pensado, e Deus permita que eu esteja errada
Mas eu estou, ah eu estou desconfiada
Que o nosso caso está na hora de acabar
Uma Trova de Juiz deFora/MG
Arlindo Tadeu Hagen
Eu vi, ao nascer do dia,
a rosa despetalada
e o assassino que fugia:
o vento da madrugada!
Um Soneto de Curitiba/PR
Vanda Fagundes Queiroz
Malogro
Intenta extravasar-se em verso ardente
a ânsia do sentir. Impetuosa...
Mas vejo que a palavra é impotente
e tem veracidade duvidosa.
Versos apócrifos — são meu presente
ao papel onde quero, em verso ou prosa,
retratar a minha alma, ardentemente,
da forma como em mim apoteosa.
Tortura-me, no entanto, a rima ausente...
Outro canto, outra luz, inutilmente
vou tenteando em minha busca ansiosa.
Descubro que querer tornar patente
este universo que há dentro da gente
é uma ação sempre falha e lacunosa.,.
Um Haicai de São Paulo/SP
Yone
Parece alarme
O canto do bem-te-vi
Sempre na mesma hora.
Uma Trova de Mangualde/Portugal
Elisabete Aguiar
Por sobre as águas do mar,
ou sobre as terras da Terra,
um avião vem lançar
bombas de Amor contra a guerra.
Um Soneto de Curitiba/PR
Vanda Fagundes Queiroz
Da terra brota a flor cada estação,
haurindo a seiva fértil do existir,
Nutrindo-se de vida, o coração
da planta vibra, em cores a expandir.
Um dia... o ar sombrio, a acridão
da quadra estéril, triste, que há de vir,
desnuda o solo, onde, em contradição,
terá lugar a ausência do florir.
A estação das flores retornando,
cor de esperança a terra se enfeitando,
a haste ostentará de novo a flor.
Murcha no peito a rosa da ilusão,
a seiva não renova, e o coração
passa, infecundo, à estação da dor.
Hinos de Cidades Brasileiras
Montes Claros/MG
Nas manhãs gloriosas das Bandeiras,
Nascestes protegida pela Cruz,
Plantada pela fibra de Figueira,
Ao pé dos montes, refletindo luz.
No sertão ressequido das Gerais,
O pranto inaugural dos filhos teus
Rasgou teu solo, para nunca mais
Perderes lutas nem perderes Deus.
Salve, Montes Claros! És nortestrela!
Crescendo arrojada e altaneira,
História vais fluindo de bravuras
Com o orgulho de seres brasileira.
Tu és uma cidade consagrada
Pela vez dos teus bardos e cantores,
Que centelhas de ouro, na alvorada,
Semearam, exaltando os teus primores.
Os dois irmãos alertas, lucilantes
Louvam o teu progresso, tua grandeza,
E em sintonia, nos teus horizontes,
A Liberdade brilha em realeza.
Salve, Montes Claros! És nortestrela!
Crescendo arrojada e altaneira,
Histórias vais fluindo de bravuras
Com o orgulho de seres brasileira.
Uma Trova de Fortaleza/CE
Nemésio Prata
O rostinho amarelado
encostado ao mostruário
cobiçava o tão sonhado
presente. Triste cenário!
Um Soneto de Curitiba/PR
Vanda Fagundes Queiroz
Nesta profusão oculta de sentires
que aconchego e acalento com ardor,
não estranhes quando acaso descobrires,
misturada a tanta cor, a tua cor.
Se entre as ânsias de minha alma um dia ouvires
um som que possa a um lamento enfim se opor,
é tua a voz! E feliz quando me vires,
da alegria que eu sentir serás credor.
No cinzento do meu peito, mil nuanças,
cor de rosa e de esperança, tentas pôr.
Com teus olhos, as tormentas são bonanças;
por tua mão, o agudo espinho é fina flor,
A mistura policroma já não cansa
quando, em meio a tanta cor, há a tua cor…