PÚBLIO JOSÉ
Pesquisas mais recentes sobre o funcionamento da mente humana, sobre os elementos que regem a formação da inteligência e suas várias formas de manifestação, demonstram não haver, necessariamente, nenhuma relação entre a inteligência e a moral. Os estudos, da mesma forma, concluem pela inexistência de conexão entre a inteligência e a ética, como também entre ela e o caráter. Nesse território ainda pouco vasculhado da mente, a conclusão a que se chega, lamentavelmente, é que o personagem de uma história, para ser inteligente, não terá, obrigatoriamente, de agir em sua comunidade como pessoa de moral, de caráter, de boa índole. Por tais estudos, a inteligência está desatrelada dos demais elementos que constituem a base do comportamento humano, para planar, como águia, acima dos valores e escolher o rumo indicado pela individualidade e pelo livre arbítrio.
Tais considerações são pertinentes pelo momento de verdadeira inversão de valores que se observa, praticados na vida das pessoas, independente do segmento social que se venha a analisar. Maliciosos, antiéticos e imorais são visíveis em todos os quadrantes a olho nu, sem a necessidade, para descobri-los, de sofisticados instrumentos de medição científica. De todo modo, a conclusão dos estudiosos vem a calhar, pois passa a estabelecer uma rigorosa conexão científica entre o resultado dos trabalhos acadêmicos e a realidade que se vive no dia a dia contemporâneo. E no que isso tudo resulta? Que conclusões, do ponto de vista prático, podemos tirar de tais observações? É que, se antes o homem, em sua grande maioria, agregava à inteligência fortes conceitos carregados de moral e de ética, atualmente posiciona-se numa direção contrária, separando-a e cultivando-a para a prática de delitos de toda ordem.
Se agora está explicado, cientificamente, que a inteligência corre por fora, desligada do caráter, da moral, da ética, nos trejeitos que articula diante dos embates diários da vida, está justificada, então, a onda de safadezas e malandragens que abarrota o noticiário e enche de vergonha, entre outros, os espaços mais nobres da rotina nacional. É corriqueiro, pois, notar-se o uso que se faz da inteligência a serviço dos valores mais mesquinhos, para, como isso, glorificar-se a máxima de que o negócio é levar vantagem – em tudo. Rigor exagerado no que afirmo? Gostaria demais que assim fosse. Gostaria, inclusive, de serem totalmente erradas as observações que faço em torno deste assunto e de outros que compõem o cotidiano humano. Entretanto, não se tapa o sol com a peneira. E o que fica em nós, inexoravelmente, diante da realidade que rola, é o gosto amargo da decepção, da impotência, do desengano.
E o caráter como é que fica? Pra que direção se inclina, afinal? Segundo o dicionário, o caráter é o conjunto de traços psicológicos, o modo de ser, de sentir e de agir do indivíduo. Já a inteligência é a capacidade de fazê-lo perspicaz, de fazê-lo aprender com rapidez, de adaptá-lo a situações adversas. Enfim, de resolver pepinos e propor soluções. Daí, logo se vê que a inteligência trava uma luta renhida entre devotar-se a causas nobres, tendo no caráter um bom parceiro, ou amolda-se de vez às exigências que afloram no contexto da tão apregoada modernidade. Para o caráter manter-se atrelado a princípios morais e éticos, com a inteligência se lambendo por vantagens imorais, não é tarefa fácil. Das duas uma: ou ele vence-a, subjuga-a - para permanecerem ambos num elevado padrão ético - ou também embarca na gandaia. Pois, como justificam - com cinismo - os tais inteligentes, resistir, quem há de?
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