quarta-feira, 18 de setembro de 2013

ODETTE RIBEIRO PEREIRA - UMA GRANDE DAMA.


ODETTE RIBEIRO PEREIRA


UMA GRANDE DAMA
 Lúcia Helena Pereira (*)

 Cada um de nós guarda no coração e na memória, os seus mitos interiores, suas paixões, seus afetos, suas lembranças diletas. E eu não sou diferente. Em criança elegi esses mitos, como a simbologia de tudo que mais amei, admirei e preservei. Tive a minha avó paterna, Madalena Antunes, a única que conheci e tanto admirei e de quem guardo as lições imperecíveis que nenhuma circunstância apaga. Quando se encantou, Deus emprestou-me outra avó - Maria Olívia de Vasconcelos Dutra, mãe de Mariazinha, esposa de um oficial da Marinha. 
Tive o meu avô paterno de quem pouco me lembro, mas, acima dele, papai do céu me deu o vovô Maiorana (imigrante italiano), dono da Casa Vesúvio, na rua João Pessoa, que teve verdadeiro amor por mim. 
 Tive tios maravilhosos, primos do mais dócil afeto, e, assim, a vida me mimoseou com essas felicidades.
 Sempre irreverente, fugi dospreconceito de só amar os familiares maternos. Aboli isso de minha vida e fiz minhas escolhas, passando a admirar os meus eleitos.

 MINHA TIA - ODETTE RIBEIRO PEREIRA

 Ela nasceu em São José de Mipibi/RN e ainda criança perdeu seus pais, ficando sob a tutela dos tios: Gal. Jacinto Carrilho e Zulmira Ribeiro Dantas, morando com eles na vila militar em Realengo/RJ, depois, em Grajaú.
 Seguindo o curso do seu destino, veio morar com o irmão mais velho - Antonio Basílio Dantas Ribeiro, em Ceará-Mirim/RN. Nesse ínterim conheceu aquele por quem se enamorou, Ruy Antunes Pereira, casando-se aos 28 anos. Tiveram cinco filhos: Olavo Ruy, Adelmo e Maria, que foram a óbito, ainda pequeninos, ficando, Ruyzinho e Denise.

 A minha tia Odette tinha muitos dotes: tocava piano divinamente, fazia doces saborosos, escrevia singelos versos e era mestre na arte de fazer pãezinhos, cuja receita levou com ela. Era exímia costureira. Fazia lindos trajes para a filha Denise, sobretudo em época de veraneio na praia de Muriú, confeccionando vestidos, blusas e shorts para a filha amada. Era uma pessoa alegre e virtuosa. Durante os veraneios costumava formar grupos de sua amizade, para um bom carteado.
 Ao longo do tempo, era admirável observar a sua bela vaidade: sempre bem vestida, usando saltos altos, jóias, sem descartar, jamais, os perfumes franceses, tendo, como predileto, “Fleur de Rocaille”. E era, acima de tudo, uma pessoa muito simples e de fácil convivência.

 Teve três irmãos: Antônio Basílio, Inácio José Ribeiro e Jair Dantas Ribeiro, seu mais especial irmão e amigo, ex- ministro da guerra no governo de João Goulart.

Tia Odette usou sempre do melhor carinho com os sobrinhos, os quais, retribuíam com amizade e afeição.

Guardo dela, acima de tudo, a sua elegância moral e física. Uma mulher dotada de princípios honestos, jamais se perdendo nesses caminhos. Nunca se queixava de nada e tinha, em especial, a arte de sublimar as intempéries da vida. Estava sempre cheia de alegria. Sua casa, na avenida Deodoro, tinha a sua própria personalidade, a contar pelo jardim com os jarros abundantes dos mais belos espécimes vegetais. E ali ela recebia parentes e amigos, para lanches deliciosos, numa casa confortável e bem cuidada. Tio Ruy, que adorava ler e escrever, ficava no andar de cima, nas horas dessas tertúlias da esposa Detinha, (como a chamava carinhosamente) onde ele tinha sua escrivaninha e instrumentos para os seus momentos epistolares. 

Quando me casei e nasceu o meu primogênito - ABEL - tio Ruy e tia Odette foram visitá-lo e levaram lindos presentes. Mas tio Ruy logo reclamou: ”ora, filha, o nome dele devia ser Abel Neto, numa homenagem a Bebé” (Abel Antunes Pereira, meu pai e irmão dele). Mas expliquei-lhe que meu marido não quis perder seu sobrenome. 
 Adorava as visitas de tia Odete à minha casa no Condomínio Jardim Nova Dimensão. Tínhamos as afinidades maiores do coração, e era um verdadeiro deleite ouvi-la falar na bondade do meu pai e na grandeza como mamãe nos educou. Geralmente ela chegava às 15:30, com o motorista, Sr. José, e saía às 17:30. Jamais faltou um bom assunto, ela era um rio sempre cheio. E eu vibrava ao vê-la descrever os vestidos de sua época, os bailes, as marrafas de marfim que as mulheres usavam nos cabelos, as músicas, os leques madrilenos, as luvas de seda, e as grandes valsas que me levavam a imaginar la belle époque de la France... Adorava os filhos: Ruy Pereira Júnior e Denise Pereira Gaspar, o genro Arnaldo Neto Gaspar, a nora e os netos, aos quais se referia com o olhar iluminado: “Ah! Lucinha, serão eles a continuarem nossas vidas”... Não me lembro de alguma vez ter visto a minha tia triste. O sorriso estava tatuado em seus lábios, além de gostar de brincar com as coisas que achava engraçadas. Ela foi uma pessoa especial em minha vida, dela guardo o sentimento especial do amor que não conhece limitações e aumenta, a medida em que os anos vão passando, como se fosse uma caravana de ideais, num deserto iluminado.
 E, diga-se, ela foi, acima de tudo, uma grande dama!

 Gostei de fazer essas consignações por um motivo bem simples: a saudade, que é a riqueza do sentimento humano. Em vez de lágrimas, a música da poesia, como a canção de uma ave que passa por nós, no mistério das coisas impressentidas, que são a maneira de Deus escrever versos que acabam em poesia. 

 (*) Escritora

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